ABELLIO, Raymond. Approches de la Nouvelle Gnose. Paris: Gallimard, 1981
ABELLIO, Raymond. Manifeste de la Nouvelle Gnose. Paris: Gallimard, 1989
O que vamos dizer é, em certa medida, "subversivo", mas acreditamos que hoje nossa sociedade precisa do choque de uma nova espiritualidade, que, aliás, é apenas uma formulação particular da espiritualidade de sempre. Que estamos na contramão, isso nos parece patente e até evidente. Os pensadores e literatos da moda, aqueles que ocupam hoje a vitrine da filosofia e da literatura francesas, pensam, por exemplo, que a vida é absurda, enquanto nós queremos descobrir em todo lugar sua positividade e seu sentido. Eles falam incessantemente da morte do homem, enquanto tentamos construir, edificar o homem interior. Eles são fascinados pela disseminação, a fragmentação dos signos, enquanto tentamos estar em comunhão com a ascensão, a unidade do sentido. Eles consideram que a grande lei da vida é a desintegração, a dispersão da memória, enquanto nós pensamos que a grande força da vida é a constituição do tempo em nós e a capacidade de integração dessa mesma memória. Para concluir, eles acreditam na impossibilidade da comunicação entre as consciências e os seres enquanto nós afirmamos e até postulamos como princípio de nossas concepções filosóficas o princípio da interdependência universal até sua culminação na intersubjetividade absoluta.
Note-se, aliás, que esta noção de interdependência universal, os sábios clássicos, os sábios da era moderna, também a admitem, mas unicamente no plano físico. Eles falam de gravitação universal. Se estendemos a mão, se levantamos o braço, modificamos a gravitação universal, pois mudamos, deslocamos o centro de gravidade da terra e, consequentemente, modificamos o rumo do universo até os confins das galáxias. Nós a modificamos, certamente, em uma quantidade infinitesimal, mas a modificamos mesmo assim. Mas o que eles admitem assim no plano físico, os sábios recusam no plano da alma e do espírito. No entanto, o menor sentimento, para nós, a menor emoção e o menor pensamento também se inscrevem na trama indefinida do universo. Mais ainda. Não apenas eles se inscrevem, mas estamos errados em dizer que somos nós que emitimos esses sentimentos, essas emoções ou esses pensamentos, pois na realidade eles estão inscritos desde sempre: é o universo inteiro que os induz em nós. É o que se chama em esoterismo "o eterno presente". Temos aqui, é claro, uma afirmação de princípio grave, pois ela põe em causa problemas fundamentais como o da liberdade do homem. É preciso aceitar ir até o fim com essas consequências se somos realmente um filósofo ou um pensador. Não vamos colocar aqui o problema da liberdade, claro, isso nos levaria longe demais, e devemos nos limitar a dar aqui o percurso de nosso pensamento com suas consequências.
Se admitimos, portanto, a interdependência universal para tudo o que se refere às nossas emoções e aos nossos pensamentos, ou seja, no plano da alma e do espírito, isso implica que, penetrando o mundo visível, há um mundo invisível, não um mundo de trás, mas o verdadeiro mundo, aquele do qual nossa natureza corporal nos mantém exilados. Como penetrar nele? É preciso aqui distinguir a ciência e o conhecimento. Pelo fato de que ela busca a eficácia acima de tudo, a ciência é obrigada a estabelecer divisões, ela distingue o vivo e o não vivo, o orgânico e o mineral. O conhecimento não aceita essas separações. Para ele, há vida e consciência em todo lugar, mesmo na menor quantidade de matéria e até no seixo do caminho. Esta distinção entre a ciência e o conhecimento, os contemporâneos a fazem com bastante dificuldade. E, no entanto, se considerarmos as verdadeiras motivações dos fundadores da ciência moderna, falamos de Kepler, de Galileu, de Descartes, de Newton, ficamos surpresos ao ver até que ponto suas preocupações permaneciam de ordem metafísica ou mesmo esotérica. No entanto, além desta distinção entre a ciência e o conhecimento, nós trazemos uma segunda que é capital se queremos compreender nosso pensamento, é a distinção entre a Mystica e a gnosis. Não dizemos que a mística é reacionária, é claro, mas é certo que na mística há um fator de dissolução da consciência, de adormecimento da inteligência e, consequentemente, um risco de alienação do ser. A mística conduz ao êxtase, ou seja, a quê? À fusão do ser individual no mundo, a uma saída do ser para fora de si. A gnosis é exatamente o inverso, a inteligência é ativa, ela não conduz ao êxtase, mas ao que Mircea Eliade nomeou com um neologismo de enstase, ou seja, de fato o inverso do êxtase, a concentração das potências do ser. Isso é capital: a gnosis permite o jogo da racionalidade, exigência fundamental que nós, Ocidentais, trouxemos ao mundo desde os Gregos. E, claro, há razão e razão. Houve a razão lógico-dedutiva dos clássicos que resultou nos impasses epistemológicos que conhecemos hoje e na crise dos fundamentos da ciência, mas há uma outra "razão" que chamaremos, sem modéstia, superior à precedente e que Husserl designou como a razão transcendental. É justamente a razão dos gnósticos, e é preciso tentar provar sua existência e justificar sua legitimidade. Evidentemente isso não é fácil e é bem certo que em alguns minutos podemos apenas tentar apreender seu modo de operação em sua essência.
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